Cinema&Café: Spotlight: Segredos Revelados

09 março 2016

Por Marina Landert

Spotlight: Segredos Revelados (2015)

Ficha técnica
Diretor: Tom McCarthy
Escrito por: Tom McCarthy, Josh Singer
Elenco: Mark Ruffalo, Michael Keaton, Rachel McAdams, Liev Schreiber, Stanley Tucci, John Slattery
Sinopse: Baseado em uma história real, o filme conta a história de uma equipe investigativa do jornal Boston Globe que em 2001 revelou o escândalo de abuso de crianças por padres católicos e acobertados durante anos pela Igreja.
Olá gente, tudo bem? Minha primeira resenha para o blog e um dos filmes mais falados nas últimas semanas – Spotlight: Segredos Revelados - ganhador do Oscar de melhor filme, e que desbancou alguns dos ganhadores de outras premiações como O Regresso e A Grande Aposta (Globo de Ouro e Sindicato dos Produtores).
A imprensa é um tema imensamente abordado por Hollywood em filmes consagrados como Todos os Homens do Presidente (1976), Boa Noite e Boa Sorte (2005), Frost/Nixon (2008), A Montanha dos Sete Abutres (1952), Cidadão Kane (1941), O Quarto Poder (1997), O Informante (1999), entre outros, sempre enfatizando seu viés de formador da opinião pública, como órgão regulador do sistema democrático e principalmente em como o papel da imprensa pode mudar o rumo da sociedade.
É a partir desta tônica da imprensa que se desenvolve Spotlight, em como o jornalismo investigativo teve um papel fundamental em revelar uma série de escândalos e impactar em mudanças em como a Igreja Católica se responsabiliza e pune abusos cometidos por padres. Em 2001, o Boston Globe, maior jornal do estado de Massachussets e entre os 25 mais importantes dos Estados Unidos, contratou um novo editor, Marty Baron, que mesmo encontrando resistência no jornal resolve colocar sua equipe investigativa – Spotlight – para apurar abusos infantis cometidos por um padre de Boston nos últimos 30 anos e que teriam sido acobertados pelo Arcerbispo de Boston – Cardeal Law. Ao aprofundar a investigação, a equipe se depara com uma rede de abusos de mais de 70 padres acobertada pela igreja e por advogados, onde os padres eram transferidos de congregação a congregação após a descoberta dos casos.

Para Spotlight, um dos maiores acertos é a sutileza com que uma história tão pesada e delicada é contada, não se atentando aos acontecimentos em si, mas sim como ela é investigada e descoberta por esse grupo de jornalistas, a ligação emocional de cada um deles com a história e as vítimas, o cuidado que com essa história seria contada e como ela chegaria à opinião pública. A direção de Tom McCarthy também acerta ao mostrar em enquadramento aberto uma Boston extremamente católica combinada com uma ótima trilha sonora que dita a narrativa da trama.

Para poder entender os desdobramentos e toda a investigação feita por Spotlight é importante compreender o contexto pelo qual se passava os Estados Unidos naquele período e principalmente as características da cidade de Boston. Boston, que fica no Estado de Massachussets, é a cidade de maior população católica dos Estados Unidos, de acordo com o Huffignton Post (2015) – 36% da população da cidade. Assim, é possível entender um pouco o peso das descobertas perante a sociedade e a dificuldade mostrada no filme que a equipe enfrenta durante a investigação. A denúncia original sobre abusos de 20 padres havia sido feita por um advogado ao Boston Globe oito anos antes, mas não foi levante adiante. Ironicamente, foi necessária a vinda do editor judeu Marty Baron disposto a enfrentar toda uma rede composta por Igreja Católica, advogados, juízes e simpatizantes. Além disso, em meados da investigação acontecem os atendados ao World Trade Center em 11 de setembro, direcionando todos os esforços do jornal e colocando mais uma vez em xeque se a história seria contada.

Outro aspecto que o filme retrata muito bem e que sempre foi um dos dilemas nas grandes coberturas jornalísticas é sobre a hora certa da publicação, neste caso especificamente publicar apenas a história de um padre ou investigar o caso completo? Correr o risco de um jornal concorrente ganhar a história exclusiva porque a decisão editorial foi aguardar e fazer a cobertura completa? Este é um dos grandes dilemas em Spotlight retratados pelo principal repórter Michael Rezendes, muito bem interpretado por Mark Ruffalo e por uma das vítimas, Phil Saviano. No caso de Spotlight, a decisão do editor Robby Robinson (Michael Keaton) de fazer a cobertura completa se mostrou muito acertada, uma vez que o Boston Globe publicou cerca de 600 reportagens sobre o assunto e 249 padres foram publicamente acusados de abuso infantil.

O elenco é outro ponto positivo do filme, liderado por Mark Ruffalo e Michael Keaton, como o repórter e editor da equipe de Spotlight, respectivamente. Também destaco a sóbria atuação de Rachel McAdams, mais acostumada com comédias românticas, mas que aqui tem uma atuação impecável. Liev Schrieber, no papel do novo editor do Boston Globe e Stanley Tucci, ótimo como o incansável advogado Mitchel Garabedian também complementam o ótimo elenco, premiado pelo Sindicato de Atores.
 Agora saindo um pouco sobre a história revelada por Spotlight e falando sobre o jornalismo em si, o filme assim como antecessores do gênero desperta um grande saudosismo para os jornalistas de plantão – assim como eu - aos românticos da velha reportagem, da ética jornalística, de como a profissão pode fazer a diferença e mudar a sociedade, desvendar casos de corrupção e injustiças, e algumas práticas por vezes perdidas em meados do século 20, antes da digitalização das redações. Se em Todos os Homens do Presidente o público conseguiu se sentir na pele dos repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein e investigar o escândalo Watergate que culminou com a renúncia do presidente Richard Nixon, em Spotlight o filme nos coloca na pele da equipe ao tentar revelar as injustiças cometidas por membros da instituição mais tradicional da sociedade.

Mas e o jornalismo hoje? Até que ponto a lógica do capitalismo financeiro e os interesses dos conglomerados empresariais modificaram a imprensa e sua relação com a opinião pública? O jogo de interesses permeado na sociedade e que também vemos em Spotlight impede que cada vez mais o jornalismo possa trazer descobertas que impactem na sociedade? Qual o limite de interesses políticos, econômicos e sociais na independência editorial e na ética jornalística? Tais questões estão no centro da discussão do jornalismo e os desafios que a profissão tem enfrentado com sua digitalização e com novos meios, mais independentes e alternativos. Para a mídia impressa, já é mais que comprovado o impacto causado pelo surgimento de novas mídias. O jornalismo investigativo, como pôde ser visto em Spoltight não é gratuito, é um investimento caro, e que muitas vezes é o oposto do que os grandes conglomerados de mídia buscam. A descoberta feita por Spotlight atualmente é uma utopia (Hoje a equipe de Spotlight ainda existe no Boston Globe e foi ampliada para 6 jornalistas)? Dificilmente. Permeada por interesses ou não, por vezes de forma independente, o jornalismo investigativo ainda respira e se faz necessário mais que nunca para o fortalecimento da democracia, sendo no meio impresso, digital ou eletrônico.
 Assim, Spotlight é um filme que com muita sobriedade mostra o corajoso trabalho de uma equipe jornalística que cumpre tudo o que se espera da profissão e consegue ter um impacto significativo na sociedade, além de deixar uma importante reflexão sobre o futuro da profissão.
Em tempo, para quem gosta do assunto recomendo Todos os Homens do Presidente (DVD e livro – Carl Bernstein e Bob Woodward), a série Newsroom (HBO), O Informante, Quase famosos, Nos Bastidores da Notícia e no fim do mês estreia Conspiração e Poder, filme estrelado por Robert Redford e Cate Blanchett que conta reportagem investigativa feita pela CBS em 2004 sobre o presidente George W. Bush que abalou a carreira de dois funcionários da emissora.

“Às vezes é fácil de esquecer que passamos a maior parte de nosso tempo tropeçando no escuro... Reportagens que terão impactos imediatos e significativos em nossos leitores. Para este tipo de história, é por isso que fazemos isso”. Marty Baron
Até a próxima!
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Marina Landert
Sobre o Autor Marina Landert, ou Mari, como preferir. Jornalista viciada em uma boa história e que não vive sem um bom livro na bolsa. Apaixonada por filmes, séries, música e por viajar. - See more at: http://intheskyblog.blogspot.com.br/p/sobre.html#sthash.OY3ZbdQT.dpuf

20 comentários :

  1. Puxam que resenha! Parabéns, Mari, ficou nível de profissional mesmo.

    Agora, focando no texto. O filme parece muito bom, o foco na equipe de jornalista deu um tom original e inovador, afinal filmes sobre jornalistas focam mais no dia a dia da equipe e deixam as notícias em segundo plano; já filmes com denúncias polêmicas, focam no fato denunciado e os jornalistas são elementos menores, tratados quase como objetos de cenário. Não assisti Spotlight, mas ao que parece ele junta os dois argumentos: mostra a situação dos repórteres e dos padres acusados de pedofilia - um achado.

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  2. Olá Helana,

    Quase não vejo filme, moro longe de um cinemas. Fiquei tão curiosa sobre esse filme, que vou tentar assistir e conhecer ainda mais dessa história.
    Filmes sobre jornalistas sempre é empolgante, saber como vão conduzir a história e se publica ou não.
    Parabéns pela resenha, gosto de livros ou filmes eletrizantes.
    beijos

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  3. Olá resenha UAL! Eu tinha ouvido falar do filme , porém não sabia de verdade do que falava, caramba que filme! Hoje em dia é muito difícil um jornalismo de qualidade pelo conteúdo, prostituiram nossas mídias com o único objetivo de ganhar audiência e para isso vale tudo, até mesmo se omitir e colocar apenas futilidades, também sou saudosa nesse sentido, queria uma mídia mais comprometida em trazer informação e a verdade para a sociedade, quem sabe um filme assim faça com que o povo repense o lixo que nos vem sendo empurrado goela abaixo e nos faça cobrar mais criticamente por conteúdo de qualidade.
    Parabéns pelo post!!
    Beijos

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  4. Olá!

    Estudo jornalismo também, então estou bem nesse dilema. Eu assisti Todos os Homens do Presidente (e adorei) e desde então eu penso em que rumo o jornalismo vai tomar, como sobreviverá aos interesses dos grandes conglomerados, sem falar na qualidade. Será que vale a pena publicar qualquer coisa em busca de cliques e vendas? Parabéns pelo texto.

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  5. Olá, eu não conhecia o filme mas gostei da premissa dele. Tem muitos pontos positivos e que me agradaram bastante.

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  6. Eu fico abismada com resenhas tão bem embasadas, parabéns! A minha preguiça as vezes não me deixa ser tão profunda.
    Não sabia que o filme focava na religião mais forte na cidade, na verdade, não sabia nadinha do filme! Com certeza vou conferir.
    Beijão, Mari

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  7. Olá... Marina... tenho ouvido falar no filme por causa do Oscar, mas confesso que nunca tinha me aprofundado muito no enredo... lendo sua resenha percebi o quanto eu vou adorar assistir esse filme... tem atores excelente e parece que o filme é bem produzido e desenvolvido... de frente a uma investigação de pedofilia entre padres não é de se esperar nada melhor e o filme ganhar o Oscar... então você conseguiu despertar o meu interesse... xero!!

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  8. uau, que filme! Eu já havia ouvido falar, mas assumo que não me chamou tanto a atenção. Entretanto, depois dessa sua resenha preciso assumir que a curiosidade começou a bater na minha porta.. e eu... a-bri. Senhoras e senhores, ponham a mão no chão...
    Desculpa, me empolguei com a música da infância.rs.

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  9. Oi, só fiquei sabendo desse filme pois foi indicado ao Oscar (e venceu!), antes disso eu não sabia muito bem sobre o que se tratava.
    Tenho visto diversos comentários a respeito e cada vez tenho mais vontade de assistir.
    Adorei sua crítica a respeito desse filme...seja bem vinda, vou acompanhar suas postagens sempre que puder :)

    Super beijo

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  10. Oi, Marina! Parabéns pela primeira resenha, muito bem escrita por sinal.
    Eu quero muuuito ver esse filme. Primeiro por conta dos atores. Adoro o Ruffalo, acho a Rachel ótima, assim como o demais atores. Segundo porque esse assunto das igrejas e dos padres abusivos eu acho suuuuper interessante - triste, mas interessante -, e ser tratada e exposta assim na mídia, então, impactando a todos, putz, deve ser demais e eu preciso assistir!
    Um beijo
    www.viciadosemleitura.blog.br

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  11. Nossa, estava curiosa pra assistir esse filme, vi a premiação do Oscar e quando soube que era baseado em fatos reais fiquei morrendo de vontade de ver.
    Sua resenha ficou perfeita, com certeza irei assistir em breve.

    Beijos
    http://conchegodasletras.blogspot.com.br/

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  12. Olá! Esse filme me chamou bastante atenção, gostei bastante da trama dele, já que foi baseado em fatos reais...Imagino esse tumulto na época, fazer denúncias desse calibre não é pra qualquer um. Parabéns pela resenha crítica, foi ótima! Beijos!

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  13. Oie!
    Confesso que até então eu não estava interessada no filme, mas depois que li mais sobre ele, fiquei curiosa. O tema é bem interessante, e o elenco contratado é de qualidade. Preciso assistir para descobrir o que vou achar sobre essa história.
    Bjks!
    Histórias sem Fim

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  14. Hello!

    Antes mesmo de ganhar o Oscar de melhor filme, eu ja queria assistir Spotlight: Segredos Revelados.
    Achei a trama mto tensa e me da ate raiva de saber que é baseado em algo que acontece.
    O elenco está um arraso mesmo, e com certeza o filme mereceu o prêmio.
    Gostei mto de ler a sua critica sobre o fime, com certeza me deixou mais curiosa.
    Beijos!

    Livros e Sushi • Facebook InstagramTwitter

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  15. Oie
    ouvi falar bastante e estou mega curiosa pelo enredo, parece ser um filme muito legal e diferente, gostei da resenha

    Beijo
    http://realityofbooks.blogspot.com.br/

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  16. Saudações literárias! Pelo seu post, fiquei com muita vontade em assistir. Só que tem um pequeno problema, aonde moro não tem cinema, vou ter que apelar e baixar pela net heheheh.

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  17. Oi,
    Confesso que só ouvi falar do filme depois que ele ganhou o Oscar! Rsrsrs Lendo a sua resenha fiquei curiosa para assistir o filme, quero mt entender o que essa equipe "sofre" para fazer matérias de qualidade para sociedade.
    Bjs!
    Fadas Literárias

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  18. Olá.
    Tudo bom?
    Nossa suas impressões do filme foram brilhantes, mas infelizmente não me atraiu, não sou muito fã desse tipo de filme, então vou deixar passar a dica.
    Beijos

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  19. Oie

    Adorei sua resenha!! Muito bem feita.
    Só de ter Mark Ruffalo no elenco já me conquista!
    Gosto de filmes com tramas intensas e ainda mais com coisas que realmente acontecem, vou procurar assistir o mais breve possível.

    bjs
    Fernanda
    http://pacoteliterario.blogspot.com.br/

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  20. Olá, ainda não assisti esse filme, mas tenho muito interesse em vê-lo por conta do Oscar e principalmente da história.
    Muito boa a resenha, parabéns!
    Gostei muito da ideia do filme, esse jornalismo investigativo, a forma com que o diretor focou na história.

    Beeijos, Erica Regina
    Blog Parado na Estante / Fanpage Parado na Estante

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